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quarta-feira, 9 de junho de 2010

Vai votar nulo?

Recebi do meu primo mais um daqueles emails fazendo campanha ao voto nulo. Como ele diz que quer fazer Direito, resolvi dar a ele uma resposta bem caprichada, tanto que vou compartilhar aqui no blog.

Na verdade, ninguém sabe o que aconteceria se a maioria da população votasse nulo. A Constituição diz que só valem os votos válidos na contagem - isso exclui brancos e nulos.

Art. 77. A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República realizar-se-á, simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato presidencial vigente. 

§ 2º - Será considerado eleito Presidente o candidato que, registrado por partido político, obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos.
§ 3º - Se nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação, far-se-á nova eleição em até vinte dias após a proclamação do resultado, concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que obtiver a maioria dos votos válidos.

Essa legislação a que o e-mail que você mandou se refere é o Código Eleitoral, que diz o seguinte:

Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.

Repare que no texto diz NULIDADE, não VOTOS NULOS. Nulidade, para o Código Eleitoral é isso aqui:


Art. 219. Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo.
        Parágrafo único. A declaração de nulidade não poderá ser requerida pela parte que lhe deu causa nem a ela aproveitar.
Art. 220. É nula a votação:
        I - quando feita perante mesa não nomeada pelo juiz eleitoral, ou constituída com ofensa à letra da lei;
        II - quando efetuada em folhas de votação falsas;
        III - quando realizada em dia, hora, ou local diferentes do designado ou encerrada antes das 17 horas;
        IV - quando preterida formalidade essencial do sigilo dos sufrágios.
        V - quando a seção eleitoral tiver sido localizada com infração do disposto nos §§ 4º e 5º do art. 135.
        Parágrafo único. A nulidade será pronunciada quando o órgão apurador conhecer do ato ou dos seus efeitos e o encontrar provada, não lhe sendo lícito supri-la, ainda que haja consenso das partes.
  Art. 221. É anulável a votação:
I - quando houver extravio de documento reputado essencial; 
II - quando fôr negado ou sofrer restrição o direito de fiscalizar, e o fato constar da ata ou de protesto interposto, por escrito, no momento: 
III - quando votar, sem as cautelas do Art. 147, § 2º. 
a) eleitor excluído por sentença não cumprida por ocasião da remessa das folhas individuais de votação à mesa, desde que haja oportuna reclamação de partido;
b) eleitor de outra seção, salvo a hipótese do Art. 145;
c) alguém com falsa identidade em lugar do eleitor chamado.
        Art. 222. É também anulável a votação, quando viciada de falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o Art. 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei.

As eleições para deputados e vereadores seguem o critério proporcional, aí só contam os votos válidos. Funciona assim:
 
Art. 106. Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior.
Art. 107 - Determina-se para cada Partido ou coligação o quociente partidário, dividindo-se pelo quociente eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação de legendas, desprezada a fração.
Art. 108 - Estarão eleitos tantos candidatos registrados por um Partido ou coligação quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido.

Em NENHUM lugar do Código Eleitoral encontrei esse negócio de nova votação para 50% de votos nulos, muito menos que os candidatos daquela votação seriam inalistáveis. (Se alguém achar isso, manda o artigo nos comentário, por favor. To curiosa pra ver isso) (Aliás, se isso fosse real, deveria estar nas condições de inelegibilidade previstas na Constituição). Só achei isso aqui:

Art. 201. De posse do relatório referido no artigo anterior, reunir-se-á o Tribunal, no dia seguinte, para o conhecimento do total dos votos apurados, e, em seguida, se verificar que os votos das seções anuladas e daquelas cujos eleitores foram impedidos de votar, poderão alterar a representação de candidato eleito pelo princípio majoritário, ordenará a realização de novas eleições.

Essas seções anuladas são votos não apurados, por causa da nulidade explicada acima. Se foram muitos votos anulados, a ponto de poder modificar o resultado das eleições, haverá novas eleições somente nas seções anuladas, com os mesmos candidatos.

Já li em revistas (na SUPER, por exemplo) que existe uma possibilidade de novas eleições no Código Eleitoral, mas não encontrei nada no código que realmente dissesse isso. (Novamente, se alguem encontrar no CE ou em outra lei, me avisa!) Se esse dispositivo realmente existe, ele é inconstitucional. Como é anterior à Constituição, o certo seria dizer que ele não foi recepcionado pela CF/88. Quem declara a inconstitucionalidade é o STF, que é o guardião oficial da Constituição (e costuma decidir o que bem entende, não importa o que acha o resto do mundo - vide ADPF 153).

O voto é um dos direitos fundamentais do cidadão. Se você vota nulo, entrega aos outros o poder de decisão. Aliás, é uma decisão sua votar em alguém ou em ninguém - se só contam os votos válidos, tanto faz se é branco ou nulo, então, né? Há um tempo atrás, outra geração - não a nossa - brigava pelo direito de votar. Pra mim, abdicar desse direito é desperdício e não leva a nada. (Acha mesmo que o STF vai decidir o que não quiser? Eles tem cargo vitalício - só perdem por sentença judicial transitada em julgado)

Como eu acho que todo mundo merece ouvir várias opiniões antes de decidir seu voto, seria justo você repassar esse email pra todo mundo que você repassou o outro, né? (E se vcs quiserem mandar o link da postagem como respota toda vez que receberem um email desses eu nem vou achar ruim hahaha)

Vote como quiser, mas não vote enganado. Conheça os candidatos, e se for votar nulo, não vote iludido!

5 comentários:

Anônimo disse...

Dra. Annie Adelinne falando!
Pessoal o negócio é conhecer o seu candidato, saber quais suas propostas, saber o que ele já fez e cobrar, votar nulo não é solução.
Beijinhos

Deise disse...

Eu sempre digo pro povo lá de casa quando querem anular o voto, que estão deixando que os outros decidam por eles, e não é que eu estou certa? rsrs.
Ótimo post, esclarecendo a dúvida de muitaaa gente.
Beijos

Annie Mucelini disse...

Mona e Deise
Concordo com vcs. Não largo meu direito de votar por naaaada. É meu e ninguém tasca! hahaha

Cíntia Mara disse...

Eu voto nulo na maioria das vezes, independente de valer alguma coisa ou não. Sou teimosa demais pra me conformar com o "menos pior". Principalmente nas eleições municipais. Contagem parece a república do café com leite, sabe? Duas "famílias" se alternando no poder e as duas são péssimas opções. E agora, além da família PSDB e da PMDB, temos a do PT também, que não mudou nada. :-(

Tô com preguiça de ler esses artigos, acredito em você, rsrs (alguém me explica porque algum dia na minha vida eu pensei em fazer direito se acho um porre todas essas leis???). Queria saber qual a diferença de nulo pra branco, então, já que ambos são desconsiderados. Será que algum dia já teve diferença? Ou que a inteção de quem "inventou" era realmente dar uma opção a mais ao eleitor, mas na hora de aprovar as leis, mudou tudo (já vimos isso acontecer outras vezes, né? Adaptar a lei pra que seja aprovada.) Ou será que foi um modelo copiado de outra república, com leis diferentes?

Bom... Ignore caso eu tenha falado alguma besteira. Meu negócio é pensar no algoritmo mais seguro pra urna eletrônica, ou qq coisa parecida, haha.

Annie Mucelini disse...

Também quero saber qual é a diferença, Cintia. Talvez seja simplesmente ideológica, mas aí só faz sentido nas cédulas de papel.

Eu não acho que seja exatamente se conformar com o 'menos pior'. É que eu tenho a ideia de que sua reclamação não é legítima se você se absteve de escolher.

É, eu, por outro lado, não estou muito interessada em fazer a urna funcionar, desde que funcione hehe